Histórico
A toponímia de uma região (nomes próprios de lugares) consubstancia aspectos relacionados às camadas linguísticas, à história, à geografia de um espaço geográfico. No Brasil, a toponímia, do ponto de vista linguístico, foi estudada, ao longo de mais de três décadas, pela Profa. Dra. Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick – da Universidade de São Paulo (USP) –, que construiu uma teoria toponímica voltada para a realidade brasileira. Pautada em clássicos da área, dentre outros, Albert Dauzat (1926), Theodoro Sampaio (1928), José Leite de Vasconcelos (1931), Charles Rostaing (1945), George Stwart (1954), Levy Cardoso (1961) e Carlos Drumond (1965), Maria Vicentina Dick concebeu princípios e modelos teóricos com vistas a subsidiar a produção do Atlas Toponímico do Brasil (ATB) e o Atlas Toponímico do Estado de São Paulo (DICK, 1990; 1992; 1996; 1999; 2006…) que também têm orientado as pesquisas toponímicas em desenvolvimento nas diferentes regiões do Brasil, dentre elas, a que tem como propósito a elaboração do Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul – ATEMS.
A gênese do Projeto ATEMS teve a sua primeira motivação no convite formulado pela Profa. Dra. Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick à Profa. Dra. Aparecida Negri Isquerdo, em 1993, para construir um atlas dos topônimos dos municípios de Mato Grosso do Sul, desafio esse aceito e iniciado, efetivamente, uma década depois (2000).
O trabalho acadêmico pioneiro sobre a toponímia sul-mato-grossense foi produzido no Programa de Mestrado em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campus de Três Lagoas, por Schneider (2002): Um olhar sobre a toponímia do pantanal sul-mato-grossense: a toponímia de acidentes físicos, orientada pela Profa. Dra. Aparecida Negri Isquerdo. Na esteira desse trabalho, no mesmo programa e sob a mesma orientação, outras seis dissertações se seguiram: Dargel (2003); Tavares (2004); Gonsalves (2004); Tavares (2005), Souza (2006) e Bittencourt (2015). Ainda na UFMS, porém no Programa de Mestrado Estudos de Linguagens/Centro de Ciências Humanos e Sociais/Campo Grande, quatro outros trabalhos acadêmicos, voltados para o estudo da toponímia de Mato Grosso do Sul, foram produzidos como dissertação de Mestrado: Castiglioni (2008); Cazarotto (2010), Oliveira (2014), Ribeiro (2015) A metodologia do ATEMS subsidiou também a elaboração da dissertação de Pereira (2009) sobre a toponímia de Goiás.
Tendo em vista que os trabalhos mencionados pautaram-se nos mesmos princípios metodológicos, singularizando-se pelo enfoque adotado para a análise dos topônimos que foi definido pelo pesquisador, em função dos objetivos da pesquisa e da natureza dos dados, surgiu a proposta de integrá-los a um projeto único, cuja intenção primeira seria a de investigar todo o sistema de nomeação dos elementos geográficos do Estado, seguindo os mesmos procedimentos teórico-metodológicos. Nessa perspectiva, a primeira fase do Projeto ATEMS (2002 a 2007) foi voltada para o levantamento, a catalogação e a classificação dos topônimos dos elementos físicos da toponímia rural de toda a malha municipal do estado de Mato Grosso do Sul, à época formada por 78 municípios. Acresce-se ainda que as dissertações produzidas sobre a toponímia sul-mato-grossense a partir de dados do ATEMS foram examinadas pela Professora Dra. Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick, consultora científica do ATEMS.
No período de 2008 a 2011, o ATEMS dá continuidade às pesquisas toponímicas no Mato Grosso do Sul, mas, a partir desse período, como projeto de natureza coletiva e interinstitucional, sediado na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), realizado em parceria com duas outras universidades públicas do estado: Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). A partir de 2011 passou a contar com a colaboração de uma pesquisadora da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Os trabalhos dessa etapa foram executados com financiamento da FUNDECT – Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do estado de Mato Grosso do Sul. Nessa etapa houve ampliação do inventário de topônimos que foram analisados e devidamente armazenados no Banco de Dados do ATEMS. Esse estágio do ATEMS (2008 a 2011) se encerra com a conclusão da primeira versão dos dois produtos previstos no projeto: o Banco de Dados e o Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul, inédito trabalho de mapeamento toponímico de um estado brasileiro. Além disso, foi produzido o livro com estudos acerca de tendências da matriz toponímica do Estado evidenciadas pelo ATEMS.
A partir de 2012, o Projeto recebe apoio financeiro do CNPq – Conselho Nacional de Ensino e Pesquisa e estabelece novas metas a serem alcançadas: i) ampliação do corpus toponímico com dados da toponímia de acidentes humanos rurais oficiais dos atuais 79 municípios do Estado; ii) início da constituição do corpus de toponímia urbana oficial e paralela das cidades sedes e distritos da malha municipal do Mato Grosso do Sul; iii) estudos pontuais da toponímia registrada em fontes históricas (relatos de viagens; cartografia histórica), produzidas em períodos pretéritos da história do Estado. A produção do dicionário de topônimos sul-mato-grossenses e ainda a realização de estudos que possibilitem a inserção da toponímia como tema mais frequente de pesquisa na educação básica também são metas a serem alcançada na fase atual do projeto.
O ATEMS busca, enfim, responder ao duplo desafio de estudar a toponímia do Estado de Mato Grosso do Sul, nas perspectivas linguística e etnodialetológica, e fornecer dados que possam se somar aos de outros projetos do gênero em desenvolvimento em outras universidades brasileiras.
A toponímia é considerada como um testemunho da história, das características linguísticas e físico-culturais de um espaço geográfico.